Saí de Nova Iorque, cometi a loucura, cidade que chamei de casa por três anos e meio. Já ouvia dizer antes que essa seria, para quase todos, uma decisão difícil. Nova Iorque te hipnotiza e te faz acreditar que é lá que vai encontrar o que tá procurando, não precisa nem saber o que é, já que lá tem tudo mesmo. Os primeiros momentos são de êxtase e alegria, pois estamos não só vivendo no cenário de um filme, mas de muitos dos filmes que crescemos vendo. Demora, mas percebe-se que a vida te segue aonde quer que vá, e em meio às liberdades que a cidade te oferece, há tantas prisões. Aí se acostuma, leva umas pauladas na cabeça por ser brasileira/latina/mulher (entende finalmente o que vivem pessoas diferentes), vê gente de tantas outras raças, nacionalidades e identidades de gênero, idades, gostos e aparências. Vira mais uma dona de uma história, habitante de Nova Iorque, e como é bom ser exatamente você e ser apenas mais uma. Come-se bem e o que quiser, acostuma-se com estabelecimentos 24hs, sabe que muito do que está disponível no mercado mundial provavelmente estará disponível também lá. Também se acostuma com a certeza de que muitas das suas bandas preferidas passarão por lá, e se ouve muita música boa. Entende e ama o lugar de onde veio cada vez mais, e qualquer brasileiro vira amigo. Acontecem amizades com quem talvez não acontecesse antes. A vida fica boa, claro, é Nova Iorque. É papo pra mais de uma noite na mesa do bar, mas, enfim, percebe-se e escolhe, quem tem o privilégio de escolher. Escolhi voltar.
O Brasil eu vejo como um presente de meus pais para mim, e apesar de muitos falarem comigo em inglês quando vou pra Ipanema (espero que seja um efeito momentâneo), falo o português sem sotaque. É minha língua, e meu país, impossível entender a importância disso antes de viver no país dos outros. Como havia dito inicialmente, não tenho argumento nenhum, só o simples fato de estar no Brasil, sem passagem de volta, pela primeira vez desde os meus 22 anos. Eu sento na beira da água com uma amiga, olho pro Sol e pro verde que nos circunda, e um reflexo criado nesses últimos anos me pega de surpresa: ai, mas eu tenho que voltar. Me lembro que não, dessa vez não, e posso digerir as delícias do Brasil pedacinho por pedacinho, que sejam as conversas com os amigos, a macaxeira e a sombra do coqueiro, ou a fila do supermercado, onde todos falam português à minha volta. A casa onde cresci e onde encontro um pai com os pés pra cima depois do trabalho, meu irmão e seus projetos, minha prima e seu novo lugar no laboratório da universidade, posso até encontrar família quando eu quiser. E, quem diria, é aqui que encontro pedaços da minha mãe, nas homenagens bonitas pelo seu trabalho, nos seus toques no planejamento da casa de onde escrevo agora, no cheiro do cerrado e nas sucupiras-brancas no caminho pra casa. O que o Brasil é pra mim, hoje, não sei dizer, por isso estive calada. Mas me atrevo a dizer que, hoje, estou feliz nele, ouvindo o silêncio da minha vizinhança posso olhar pro quintal por muitas horas mais.
Como é bom voltar pra casa.
6 comments:
Seja bem vinda de volta, Juju.
Que nosso amor e nosso calor te abracem e te acolham.
Muac!
Bienvenue.. =)
Bom demais esse pertencer, esse sentir o seu lugar, não qualquer um, mas o seu. E bom demais ser vizinha do seu lugar, e você do meu.
=*
eu queria ter tido essa experiência.
"Nova Iorque te hipnotiza e te faz acreditar que é lá que vai encontrar o que tá procurando, não precisa nem saber o que é, já que lá tem tudo mesmo." nossa, que grande verdade vc disse com essas palavras. compartilho o sentimento.
"E, quem diria, é aqui que encontro pedaços da minha mãe, nas homenagens bonitas pelo seu trabalho, nos seus toques no planejamento da casa de onde escrevo agora, no cheiro do cerrado e nas sucupiras-brancas no caminho pra casa." lindas palavras, Ju.
Lindo texto, bateu saudades do Brasil. As vezes, esqueco minhas raizes. Criei novas raizes aqui e, sem que percebi, criei tambem uma distancia com o meu Brasil, a minha terra, as minhas primeiras raizes.
Ju, amo tanto vc! E suas palavras e seu jeito de ver a vida e sua transparência gostosa...
Amei o texto e quero te ver mais!
Beijos.
Eta
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