5.5.10

Espiral, Ju, Espiral!


Às vezes eu me olho no espelho e imagino que aquela menina (e eu um dia achei que aos 25 anos não sobraria menina alguma nessa mulher) é a mesma, e poderia ser encontrada, na mesma forma, em vários lugares do meu passado.

É porque um dia eu achei que as conquistas da mulher assustariam de uma vez por todas os medos da menina, mas não. Vez ou outra ela corre pro meu colo, e me lembra que ainda está lá, me pede cuidado.

Deve ter sido aquela ousadia toda. Medo e ousadia andam lado a lado.

Por um momento a mulher se cansa, e chama a menina de chorona. Não aguenta mais medo repetido, porque cada vez que o medo se repete parece vir com outra força, e desqualificar todas as conquistas. Um pedaço estragado na maçã e ela já está no lixo.

Já gostei do estragado, do feio, do torto (e ainda tem um pedaço meu que encontra conforto nele, como o prazer encontrado em ouvir uma horrorosa música da adolescência). Já achei que tinha nascido para ele, e ficava muito bem de preto. Mas já experimentei muito colorido, descobri muita risada daquelas de acabar com o ar, e aquela felicidade que colore a vida inteirinha. Entendi então que a menina podia rir também, e isso foi uma descoberta. E mais, aprendi que a menina desejava profundamente, e alcançava tantas vezes, essa gargalhada símbolo da alegria fácil da qual sua mãe sempre falava naqueles fins da tarde de sábado. Essa felicidade tinha cor verde, e cheiro de um Cerrado sensu stricto. Felicidade no sentido restrito da palavra.

É bonito ver a menina sedenta por essas gargalhadas.

Mas vez ou outra a gargalhada termina em um suspiro triste. E acredita que sua casa é mesmo aquela caverna escura, e foi tudo um sonho. É muito difícil viver de novo tristezas que você achou que estavam "vividas", ou seja, mortas.

Então me lembro da imagem de uma amiga, um espiral. Ou da minha terapeuta, alguns passos pra frente e um pra trás (ou melhor, alguns em uma direção e outro em outra). Sim, viver tudo de novo, uma grande tristeza. Ou uma feliz chance de viver tudo de novo, e dessa vez quem sabe, de outra maneira. Em outro plano. Porque de que será feita a vida senão de pequenas vivências, cada uma de uma cor, de um jeito, trazendo um sentimento ou outro, até que esses passem e venham outros? Pequenas sensações, como um mosaico. Estou farta da busca de sentidos, nadei muito e morri na praia demais. Hoje me conforta muito mais pensar que talvez o grande sentido seja simplesmente aumentar o meu mosaico, coisa do tempo, sabe? Viver coisas, acrescentar pedaços, mudar as cores.

Artista de mim mesma, respeito e admiro meus dias nublados. Inclusive o medo que sinto deles. Mas, na falta absoluta de idéia do que fazer, já que sentido maior nenhum nada disso tem mesmo, eu me presenteio uma possibilidade. Guardo a menina sedenta, e digo a ela que fique tranquila, um sol-sorriso logo logo brilhará.

4 comments:

Larissa said...

Nao esperava tambem que aos quase-25-anos ainda existiria a Larissa aos 6 anos, ou aos 15, ou ate aos 20, dentro de mim, com os mesmos medos e as mesmas esperancas. As mesmas ilusoes, os mesmos sonhos. Ainda tentando aprender as mesmas coisas.
Vamos vivendo, aprendendo, aprendendo de novo, crescendo, encolhendo, indo, voltando, mudando, continuando igual, entendendo e questionando.

Hélio Sales Jr. said...

Ai, Ju, às vezes parece que se eu mudasse o gênero de algumas coisas que você escreve, elas poderiam ser traduções dos meus próprios pensamentos...

Mônica Padilha said...

Essa menina que volta também pode voltar com o lado bom, e como isso é gostoso quando vem sem os medos e inseguranças, do sentimento simples, da vida bem vivida, da vontade de fazer travessuras, das conversas intermináveis com suas amigas que confia plenamente, que pode falar qualquer coisa... Eu gosto quando tenho essa sensação boa de que sou menina de novo, quando estou cantando no karaokê, dando risadas loucas sem estar bêbada, conversando sobre meninos etc...

Bateu saudade de você!

E como sempre amo seus textos, e sinto que nenhum comentário supera tal profundidade!

Nina Raquel said...

Ju, perfeito, preciso...Confortante ler suas palavras...Voce escreve lindamente!!! Eh tao bom ter alguem como voce por perto, sabia? ;) Beijos, Nina